Anabela Gradim, Universidade da Beira Interior
Absoluto
O que é considerado isoladamente em si, e não relacionado
com outra coisa. É aquilo que não depende de nada extrinseco
a ele próprio na sua constituição e especificação.
Opondo-se ao absoluto estão os relativos, que constituem relações
secundum esse, têm todo o seu ser para outro e dependem dele inteiramente.
Há ainda coisas que são médias entre estas, que constituem
relações secundum dici: são as que têm em si
algo de absoluto, e contudo na sua constituição e especificação
dependem de outro que lhe é exterior para agir ou causar alguma
coisa. É o caso da potência cognitiva a respeito dos objetos
que atinge, e que por isto tem uma ordem transcendental para aqueles.
Acidente
É o que sobrevém a um sujeito, pertencendo-lhe
como atributo, sem modificar a sua essência. O acidente não
pode subsistir por si, mas necessita de um sujeito — substância
— para ser capaz de existência. Para Aristóteles, que será,
neste ponto, retomado por São Tomás de Aquino, a substância
é a primeira categoria ou género supremo, podendo as restantes
nove categorias, quantidade, qualidade, relação..., serem
subsumidas sob o conceito de acidente.
Acto
Só pode ser concebido em relação com o conceito
de potência. Para resolver o problema do movimento — que já
fora objecto de soluções tão radicais quanto a de
Parménides, que simplesmente o negava — Aristóteles vai defender
que o movimento é consequência da passagem de potência
a acto; sendo a potência todo o manancial de possibilidades contido
numa substância, e o acto a actualização de uma dessas
possibilidades. Representa “a perfeição realizada pela acção
e possuída pelo agente” (Pires, 1989: 63). “O movimento é
a consequência do perpétuo esforço executado por tudo
aquilo que existe em potência a fim de poder passar a acto... O mundo
é Deus em potência tendendo, sob múltiplos e variados
aspectos, não a criar, mas a unir-se a Deus em acto” (Cresson, 1943:26).
Analogia
O termo ser aplicado às criaturas tem um significado não
idêntico, mas semelhante ou proporcionalmente coincidente com o ser
de Deus. Esta é a relação de analogia, que não
é identidade, nem diferença, mas semelhança sob uma
certa proporção. É que o ser das criaturas é
separável da essência, e portanto é criado, ao passo
que o ser de Deus, sendo idêntico à essência, é
necessário. É por isso que estes dois significados de ser
não são unívocos, nem equívocos, são
análogos, isto é, semelhantes mas de proporções
diversas. “Só Deus é ser por essência, as criaturas
têm o ser por participação; as criaturas, enquanto
são, são semelhantes a Deus, que é o primeiro princípio
universal de todo o ser, mas Deus não é semelhante a elas:
esta relação é a analogia. A relação
analógica estende-se a todos os predicados que se atribuem ao mesmo
tempo a Deus e às criaturas, porque é evidente que na Causa
agente devem subsistir de modo indivisível e simples aqueles caracteres
que nos efeitos são divididos e múltiplos” (Abbagnano, 1985:36).
Anjo
Substância que é forma pura, inteligência
pura, sem matéria. Um anjo não tem composição
de matéria e forma, mas tem a de essência-existência.
A essência de um anjo está em potência em relação
à existência, e por isso esta última requer o acto
criador de Deus. “Só em Deus a essência é a própria
existência, porque Deus é por essência e, portanto,
por definição; portanto, em Deus, não há uma
essência que seja potência; ele é acto puro” (Abbagnano,
1985:35).
Apercepção
É a apreensão simples ou acto pelo qual é
formado o termo mental, e compreende tanto a apreensão intelectiva
como a dos sentidos externos. Poderá ser intuitiva, que é
a apercepção de uma coisa fisicamente presente no exterior
da potência cognitiva, comportando assim existência real e
física; ou abstractiva, que é a apercepção
de uma coisa ausente. Não é tanto, como o termo parece sugerir,
o próprio acto do sujeito se aperceber de alguma coisa, mas sobretudo
o conteúdo dessa apercepção, a noção
que é gerada ou “termo mental”, como João de São Tomás
tão bem explica.
Conceito Directo
O conceito pelo qual se conhece algum objecto, sem reflectir
sobre o próprio acto de conhecer.
Conceito Reflexivo
Trata-se do conceito pelo qual o homem conhece que conhece. Tem
por objecto o próprio acto cognitivo da potência cognoscente,
daí ser reflexivo. Este conceito reflexivo não está,
obviamente, acessível às operações dos sentidos
externos.
Conceito Ultimado
É o conceito da coisa significada por um termo.
Conceito não Ultimado
É o conceito pelo qual um termo é tido como significante,
ainda que se desconheça qual o seu significado.
Conotação
Acto de apreender uma coisa não através de um conceito
próprio, absolutamente, mas conotativamente e a respeito de outro,
à semelhança do qual o objecto é concebido.
Denominação Extrínseca
Acto pelo qual se atribui um nome às coisas, nome esse
que só exprime relações com outros objectos.
Denominação Intrínseca
Acto pelo qual se atribui um nome às coisas quando exprime
propriedades intrínsecas de um objecto.
Ente de Razão
É o que depende da razão, opondo-se ao ente real
porque não tem nenhum ser nem existência fora do intelecto,
mas só objectivamente — enquanto conhecido — reside na razão.
É um tipo de ente, embora com um carácter entitativo mínimo,
porque é conhecido como se fora um ente real, mas não tem
existência física nas coisas do mundo.
Todo o ente de razão resulta da actividade cognitiva pois
é o nosso próprio modo de conhecer que constrói apreensivamente
como ente o que não é ente, pelo que todo o ente de razão
resulta da cognição.
Há dois tipos de ente de razão: negação
e relação, sendo este último que ocupa João
de São Tomás. A relação é um ente de
razão porque é puro “ser para” e portanto não pode
ser concebida absolutamente (em si), nem em outro sujeito, mas como “em
direcção a outro”.
Equívoco
Nome que é comum a várias realidades distintas,
opondo-se a unívoco. Trata-se da utilização de um
mesmo e único nome para denominar coisas inteiramente diferentes;
é o caso, por exemplo, da palavra canis em latim, que tanto pode
significar cão como constelação.
Espécie
É a semelhança ou imagem das qualidades sensíveis
de um ser que é imprimida nos sentidos para que o objecto possa
ser percebido. Não há percepção nem experiência
sem as espécies emitidas pelo objecto. A sua etimologia vem de forma,
semelhança, imagem; é aquilo que faz as vezes do objecto
tornando-o presente ao sujeito cognoscente. “Para São Tomás
e seus comentadores tratam-se de ‘formas sem matéria’, ‘semelhanças
individuais sem matéria’, qualidades sensíveis ou inteligíveis...”
(Morais, 1990:219)
Essência
Conjunto das determinações de um ser que fazem
com que este seja aquilo que é. É o que resta de um ser quando
é despojado dos seus acidentes. A essência, para São
Tomás de Aquino, não é separada, existe no objecto
e pode ser abstraída pelo pensamento. Trata-se do sujeito ou substância
que é substrato de acidentes, e engloba todas as determinações
à falta das quais a coisa deixaria de ser aquilo que é.
Fantasma
São as espécies ou imagens produzidas pela imaginação
que são “submetidas à acção iluminadora do
intelecto” (Nicolas, 1984:113).
Indução
É o acto de ascender dos singulares para os universais
(inductio per ascensum); e dos universais descender aos singulares (inductio
per descensum)
Intenção Objectiva
É a própria relação de razão
que é atribuída a uma coisa conhecida.
Intenção Formal
Trata-se do conceito pelo qual a intenção objectiva
é formada.
Meio no qual
É aquilo no qual outra coisa é vista, assim como,
por exemplo, o homem é visto no espelho — e esse espelho
é meio no qual. Pode ainda ser material e exterior ao sujeito cognoscente,
é o caso do espelho; ou intrínseco à potência
cognitiva, como sucede no caso da forma expressa ou palavra mental.
Meio pelo qual
É a espécie através da qual o objecto é
visto.
Meio sob o qual
Tratam-se das condições sob as quais alguém
apreende um objecto, assim como a luz permite a apreensão das cores.
Operações do Intelecto
São três as operações do intelecto.
A primeira é a apreensão dos termos, sem que nada se afirme
ou negue sobre eles. A segunda é a composição ou divisão,
que forma a proposição atribuindo ou negando algo ao termo.
A terceira é a elaboração do discurso, quando da verdade
de uma proposição se infere outra verdade aí não
presente.
Potência
Noção introduzida por Aristóteles que surge
para solucionar o problema do movimento e da multiplicidade no ponto
— extremamente complicado — em que os eleatas o haviam deixado,
negando pura e simplesmente a sua existência ou possibilidade. Para
explicar a mudança Aristóteles vai imaginar os seres constituidos,
simultaneamente, de potência e acto. O acto é a determinação,
aquilo que um ser num dado momento é; enquanto a potência
é a indeterminação determinável, o conjunto
de possibilidades que uma coisa, por acção do acto, pode
vir a ser.
Em João de São Tomás, todavia, este termo
é fundamente usado para se referir às potências cognitivas,
e abrange tanto os sentidos internos — o intelecto propriamente dito —
quanto os sentidos externos — a visão, olfacto, tacto, gosto...
Razão
Pode ser a faculdade de pensar, mas no sentido mais comum em
que João de São Tomás utiliza o termo é razão
e causa de porque uma coisa é tal como é. Costuma ser, também,
definida como natureza ou essência. Sendo ratio aquilo pelo qual
a realidade é o que é, confunde-se com ideia, natureza, essência,
mas é também princípio de inteligibilidade, razão
imanente, essencial e substancial das coisas. Trata-se do princípio
imanente das coisas determinando-as na sua essência e actualidade.
Relação
Trata-se de um ente que é constituido unicamente como
“ser para”, daí ter um carácter entitativo mínimo.
A relação é a ligação entre duas ou
mais coisas, que recebem o nome de termos; é portanto a referência
de um sujeito a um termo. Consta de três elementos, um sujeito
— aquilo que é referido, o que é formado e denominado pela
relação —; um termo — aquilo ao qual
o sujeito se relaciona ou para o qual tende —; e um fundamento
— aquilo pelo qual o sujeito se refere ao termo, e que é razão
e causa donde as relações obtêm existência.
Relação Categorial
É a relação em que o fundamento se distingue
do sujeito relacionado.
Relação de Razão
São as relações lógicas que se dão
em virtude das operações mentais de um sujeito que relaciona
ideias ou conceitos.
Relação Real
São as relações que se dão nas coisas
independentemente da operação mental que pode, ou não
apreendê-las.
Relação Transcendental
É aquela em que sujeito da relação se identifica
com o fundamento.
Segunda Intenção
Tratam-se das afecções que pertencem à coisa
segundo o modo como é conhecida; enquanto as que pertencem às
coisas tal como são em si constituem primeiras intenções.
As segundas intenções, que são relações
de razão, constituem propriamente o objecto da Lógica, porque
a tarefa da disciplina é ordenar as coisas enquanto existem na apreensão.
A distinção entre primeiras e segundas intenções
baseia-se na distinção entre os dois estados sob os quais
a matéria pode ser considerada: tal como é em si, quer na
existência quer na essência; ou tal como é na apreensão.
Este último estado é segundo relativamente ao ser em si,
que é primeiro, pois ser conhecido é posterior ao ser em
si do objecto.
Semelhança
É a espécie de um ser que é produzida ou
emitida pelo objecto e imprimida nos sentidos do sujeito a fim de que este
possa conhecer essa realidade que lhe é exterior.
Signo
Algo que representa ao intelecto uma coisa diferente dele próprio,
sem que constitua, necessariamente, uma realidade material e física,
pois só assim a definição de signo abrange tanto o
formal como o instrumental. O signo comporta tanto uma relação
com outro, ao qual representa, como dependência desse outro
— o seu signado — pois é sempre mais imperfeito que
aquilo que representa e manifesta ao sujeito cognoscente. O signo relaciona-se
assim com o signado como seu substituto e subordinado, e a representação
é tanto mais perfeita quanto mais próximo este estiver do
signado, com o qual tem, necessariamente, alguma conexão ou proporção.
Substância
Trata-se do substrato dos acidentes de um ser. A substância
“está sob os acidentes, é fonte de acção, revela
aquilo que a coisa é [...] é aquilo que é em si e
não noutro; é o que subsiste em si [...] aquilo de que em
primeiro lugar e principalmente se diz que é, porque é, no
plano ontológico, sujeito de todas as determinações;
porque é natureza, i.é, centro de actividade, e essência,
i.é, o que determina o ser a ser aquilo que é” (Pires,1992:1330).
Termo
É o último elemento que forma a proposição
e oração simples. Trata-se do signo convencionalmente significativo
a partir do qual se elabora a proposição, e compreende tanto
o termo mental, quanto o pronunciado ou escrito.